quinta-feira, 25 de abril de 2013

Qual máscara eu deveria usar?

Nu

Original de Osvaldo Filippsen

Todos os dias as mesmas rotinas, as mesmas pessoas e as mesmas respostas de sempre. Um dia eu cansei, parei diante do espelho e sem roupas deparei-me com a realidade do peso da minha idade, meu reflexo despido das roupas mostra um corpo cansado, marcas da vida e com um rosto triste e uma pergunta intrigante...
O que estou fazendo comigo mesmo?
Sem nenhuma máscara no rosto, aquelas usadas para enfrentar uma sociedade hipócrita, que valoriza os capitalistas e pisa em cima dos indigentes, aquelas mesmas usadas para fingir não ver um governo corrupto e um Deus falecido, enxergo-me tal como eu estou, fraco e assustado.
A sociedade e sua violência me assustam, eles roubam a minha vida e ninguém percebe nada, o governo somente cobra tributos, mas devolvem serviços precários, a vida então padece e perece nas mãos dos governantes, onde a prioridade é o lucro, a igreja destituiu a fé pelo voto, virou trampolim político para os interesses pastorais, as redes sociais alienadoras dos iludidos do terceiro mundo crucificaram e relegaram Deus ao segundo plano, mataram o criador de todos eles.
Em meio a toda essa orgia, eu despido em frente ao espelho olho meu reflexo e me pergunto:
Qual máscara eu deveria usar?
A vida me fez compras várias, que estão todas em meu armário, uma para cada situação e então, totalmente despido e pronto para sair porta a fora de minha casa, preciso escolher uma para enfrentar a selva que me espera lá fora.
Pego uma máscara com uma face de sorriso e me pergunto para quem eu deveria sorrir, para os hipócritas ou para os idiotas? Largo-a no chão, não preciso sorrir para ninguém. 
Pego uma máscara com uma face arrogante e me pergunto para quem eu deveria ser arrogante, para os iludidos ou para os humildes? Largo-a no chão, não preciso ser arrogante com ninguém.
Pego uma máscara com uma face soberba e me pergunto para quem eu deveria ser soberbo, para os arrogantes ou para os hipócritas? Largo-a no chão, não preciso ser soberbo com ninguém.
Pego uma máscara com face rude e me pergunto para quem eu deveria ser rude, para os humildes ou para os soberbos? Largo-a no chão, não preciso ser rude com ninguém.
Eu não quero usar mais máscaras, a sociedade doente não pode querer eu tome o mesmo Prozac que a mantém alienada do mundo, num sistema muito bem controlado; eles não vão me convencer de que o doente sou eu.
Confuso eu vejo no meu reflexo que ou as pessoas estão doentes, ou a sociedade enlouqueceu. As pessoas não respeitam mais a lei, tudo caiu em descrédito, à falência múltipla dos órgãos não é mais causa mortis do homem, mas sim da coisa pública, os inúteis da sociedade medíocre agonizam felizes no serviço público, eles usam máscaras com faces quem mantém a realidade de um rosto triste que se prostitui do sonho por uma estabilidade financeira.
A igreja virou trampolim político, Deus não está mais sendo eleito nos corações dos homens, ele não pode fazer mais lobby no coração de seus filhos, eles estão contaminados com o vírus da vaidade e do poder, usando suas ovelhas fiéis para garantir-lhes no poder, entre bandidos e ladrões do dinheiro público, em breve Deus não entrará mais nem na igreja, sua própria casa.
A polícia é despreparada, ela agride a toda a sociedade quando chuta o homem já imobilizado, tal como o governo faz com o seu povo, demonstrando a sua força e seu poder, escondidos atrás de uma máscara que esconde um rosto assustado e medroso, que é protegido apenas por uma farda.
A classe política usa máscaras de honestidade, protegendo e escondendo um sorriso falso e interesseiro. Eles beijam as criancinhas e apertam a mão do humilde e em casa eles tomam banho de creolina e incineram seus ternos.
A sociedade é composta por homens doentes, suas máscaras escondem faces verdadeiras, é preciso estar nu diante do espelho para ver o mundo podre que me cerca, não usar máscaras é um desafio; sonho de minha mente iludida.
Somente despido e com as minhas máscaras caídas eu pude ver e sentir o mundo que me cerca, o padre é pedófilo, o pai é incestuoso, o filho é marginal, o poder é corrupto, a lei é porca, a carne é fraca e o capitalismo é imperioso.
A hipócrita gerente do banco trata os Vips financeiros com glamour, mas sequer olha para os humildes, ela acredita estar protegida do mundo sentada atrás de sua mesa com seu terninho bem passado e com seu corpo sinuoso, dotado de um cérebro vazio. É possível ver seu semblante de assustada com a voracidade capitalista de seus patrões, ela sabe que é apenas um número no crachá, mas ela precisa seguir em frente, sua máscara de hipócrita revela todo seu perfil.
Os doutores e seus phd´s não se sustentam com todos os seus estudos, correr atrás de uma bola paga milhões aos analfabetos; a saúde é péssima, mas as arenas são obras de arte de primeiro mundo; o bandido usa arma a laser e o guarda gordo corre atrás dele de revolver na mão; a jovem riquinha debuta aos quinze em uma clínica de aborto clandestina, enquanto a pobre miserável comemora os quinze sonhando com a Disney, com bolo de supermercado e refrigereco quente de uva e groselha.
A elite ilustre desfila arrogância, descaso e poder, sugando o homem que se destaca como prêmio consolo de “funcionário do mês”, e então; num mundo tão violento, louco e interesseiro, eu aqui despido na frente do espelho vendo meu reflexo, me pergunto: - Qual máscara eu deveria usar?
Não são pelas ilusões das drogas e suas fantasias que eu vejo o mundo, prostitutas não ganham o meu dinheiro, a minha face nua e crua vê o mundo como ele é, não com máscaras prontas para agradar e pertencer.
Nem o cigarro e o álcool sacodem a minha alma, não me soltam para sorrir, não me enganam nem me iludem, a face nua e crua mostra a realidade desses caminhos para o caixão.
Não me iludo com mais nada, não espero do homem e da sua sociedade mais nada, estou aqui vendo o que sou, real, imperfeito nas virtudes, num corpo esguio, fraco, flácido e mortal.
O meu êxtase chegou quando eu tive a coragem de me ver nu, tal como nasci, enxergando toda a minha insignificância nesse mundo. Nenhuma máscara para fugir vai mostrar o mundo como ele é, é nu que se olha o mundo, é nu que se encara a vida, é nu que se morre, não trouxemos nada e não levaremos nada.
Agora eu sei as respostas, não devo usar nenhuma máscara, é nu que vivo a vida, livre de todas as doenças da alma humana.
E você, que máscaras a sociedade lhe faz usar?
Tem tomado o seu Prozac nos horários certos?
Eu?!, O que estou fazendo comigo mesmo? Nada, apenas tenho vivido nu...

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